Luciana da Silva Andrade

luciana.s.andrade@gmail.com

Visão

O Coop Housing at River Spreefeld, projeto autogerido, teve a arquitetura desenvolvida por três escritórios berlinenses – Carpaneto Architekten, Fatkoehl Architekten e BARarchitekten -, representa uma inflexão na forma de ver o projeto urbano e arquitetônico da moradia. Um grupo de pessoas buscou um modo diferente e coletivo de morar, onde a organização dos espaços foi feita segundo necessidades contemporâneas. Ainda que apartamentos privados existam no complexo, um outro programa se destaca: o do que pode ser chamado de apartamentos agrupados. Eles compartilham compartimentos que na setorização moderna seriam chamados de sociais. Não se trata de um complexo apenas residencial, mas misto, ou o que atualmente seria chamado de híbrido. Varios outros espaços coletivos permeiam o complexo formado por três blocos interconectados. Ainda que a gênese deste projeto tenha se fundado no coletivismo, este tipo de solução é polêmica. Do ponto de vista fundiário, seus críticos argumentam que o co-housing ameaça a política histórica de locação social ainda existente em Berlim, que permitia que até há bem pouco tempo atrás a habitação não se apresentasse como questão para o morador de Berlim. Outro problema apontado pelos críticos, é a reprodução deste modelo sem o seu caráter coletivista e sem a sua gênese autogerida. Sem dúvida, a riqueza da espacialidade produzida é decorrência da forma de gestão da produção e da organização do espaço. Ainda que esta realidade seja bem diversa da encontrada no Brasil, a potencialidade da autogestão é expressa nas periferias – lato-sensu – autoconstruídas. Além disto, ainda que quantitativamente inexpressiva, a produção autogerida realizada em São Paulo a partir dos anos 1990, revela que há um grande potencial para a geração de espaços urbanos e habitacionais de maior qualidade – aqui penso especialmente na produção da Usina CTAH e, mais especificamente, no Conjunto Paulo Freire.
Fiz esse longo preâmbulo para ressaltar a necessidade de ampliação da ruptura com a lógica de uma profissão que aqui no Brasil, historicamente, tem sido restrita às elites. Ainda que na modernidade tenhamos tido avanços para o acesso à cidade e à habitação, não só a pós-modernidade nos impôs recuos, como também o próprio desenho moderno das soluções, por vezes, contribuiu mais para aumentar os problemas habitacionais e urbanos do que para solucioná-los. A realidade de um país de economia periférica como o Brasil demanda a democratização profunda de ações para a melhoria da qualidade de vida da população e entre essas ações estão aquelas de transformação do espaço urbano. Ao mesmo tempo que entendo que precisamos expandir nossos horizontes, dialogando com experiências de diferentes partes do mundo, é importante termos clareza das especificidades da nossa realidade. Mais do que isto, a própria diversidade interna do país deve ser considerada, de modo que mesmo a experiência paulista, além de precisar ser aprofundada, não deve ser replicada sem uma reflexão profunda. Precisamos assumir nossa capacidade coletiva, reunindo saberes técnicos e populares, para ensejar transformações que representem uma melhoria efetiva da qualidade de vida urbana, habitacional e ambiental: para isto é necessário ampliar a capacidade de escuta. Isto significa que ensinar arquitetura e urbanismo requer ter consciência de que fazer arquitetura-urbanismo para todos é fazer arquitetura e urbanismo com todos, o que demanda uma postura epistemológica e metodológica diferente diante do processo de construção do conhecimento.

Disciplinas

Projeto de Arquitetura I  | 2014
Projeto de Arquitetura II, Ateliê Integrado I  | 2015
Projeto Optativo de Habitação de Interesse Social | 2016.1 – atualmente

 

Bio

Sou professora associada da FAU-UFRJ, desde 1996, e membro docente permanente do Programa de Pós-graduacao em Urbanismo – PROURB, desde 2002. Em 1992 concluí a especialização em sociologia urbana pelo IFCH/UERJ, em 1995 me tornei mestre em arquitetura pelo PROARQ/UFRJ e, em 2002, obtive o doutorado em Geografia pelo PPGG/UFRJ. De dezembro de 2005 a novembro de 2006, desenvolvi pesquisa de pós-doutorado sobre espaços públicos de conjuntos habitacionais (Siedlungen) em Berlim, junto à BAUHAUS Universität Weimar, com bolsa do PROBAL/CAPES-DAAD. Atualmente, com bolsa do CNPq, junto ao Laboratório Urbano, do PPG-AU da UFBA, desenvolvo a pesquisa de pós-doutorado intitulada “A Moradia Popular e a Metrópole no Contexto Atual: perspectivas para a construção de uma escola de [trans]formação urbana”. Sou bolsista de produtividade 2, pelo CNPq, no momento suspensa, devido ao pós-doutorado. Coordeno o Núcleo de atividades de ensino, pesquisas e extensão sobre o Morar – [na]Morar (anteriormente designado como CiHabE), com o desenvolvimento de várias pesquisas sobre habitação popular, especialmente ocupações residenciais urbanas, favelas e conjuntos habitacionais. Sou membro do CATÁLISE, coletivo de assessoria técnica a movimentos de lutas pela moradia, que reúne diversos grupos de pesquisa da UFRJ e outras organizações. Entre 2007 e 2010, assessorei a organização de arquitetos Chiq da Silva, no desenvolvimento de projetos apoiados pelos governos estadual e federal para ocupações no Rio de Janeiro. Entre 2011 e 2012, participei da elaboração do Plano Estadual de Habitação de Interesse Social do Estado do Rio de Janeiro. Orientei vários trabalhos e pesquisas premiados ou que receberam menção honrosa. Em 2018, coordenei a Visita de Estudos à Berlim para 15 estudantes de graduação, intitulada “Strategies and Tatics Toward Housing”. Esta visita durou 12 dias e foi financiada pelo DAAD, com recursos do Ministério de Relações Internacionais da Alemanha (Auswärtiges Amt – AA). Fui Sub-coordenadora de Ensino do PROURB (gestão 2008-2009) e desempenhei a função de coordenadora adjunta de doutorado do PROURB (gestão 2013-2014), além de participar de várias comissões.